Nunca no mesmo trajecto a viagem terá sido tão demorada, tal era a cautela do condutor em não causar bruscas movimentações ou que até o facto da velocidade do automóvel pudesse despoletar um choro no passageiro recém-nascido. Imagino que na minha primeira viagem de carro, tenha sido constantemente alvo de um par de olhos maternal e ainda, por várias vezes a mira em mim duplicava devido à atenção paternal que vinha do volante.
Para mim tudo era novo, não sei até se, de facto, me importei com o primeiro contacto com a velocidade, ou com o facto das árvores se moverem lá fora. Sei hoje que não sabia o que eram árvores nem o que realmente se movia, desprezando mesmo que desconhecia o que era o movimento.
Do hospital até casa, desconheço os sons que tenha ouvido e até mesmo se o rádio iria ligado a soar alguma música de umas das bandas que posteriormente se tornaram as minhas favoritas. Assumo apenas como certos o som das vozes dos meus pais que certamente iriam a falar de mim ou até para mim, embora eu não os conseguisse entender.
Quando o carro por final parou, teria chegado a casa e visto pela primeira vez o local que me iria ver crescer. Não pensando certamente nisso, e desconhecendo até o que era um local, devo ter ficado certamente confortável no berço que me acolheu.
O cenário que imagino mais provável é este descrito, embora possa também ter ido toda a viagem a dormir e a sonhar, se é que tenha conseguido adquirir elementos suficientes para formar um sonho em apenas dois dias de vida.